Aprovação do Projeto Antifacção expõe disputas políticas e deixa dúvidas sobre a eficácia no combate ao crime organizado
A Câmara dos Deputados aprovou, por 370 votos a 110, o chamado Projeto Antifacção, proposta enviada pelo governo federal, mas cuja condução no Congresso acabou marcada por embates políticos, críticas internas e questionamentos sobre a real efetividade das medidas.
Embora o texto endureça penas, crie novos tipos penais e amplie instrumentos de investigação, a votação Foi acompanhada por divergências entre governo, oposição e até dentro da própria base aliada — um sinal de que, apesar da ampla maioria, o consenso está longe de existir.
Relatoria contestada e ruído político
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), designou para a relatoria o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), ex-secretário de Segurança de São Paulo, que deixou o cargo para assumir a tarefa. A escolha gerou desconforto no governo, que viu a mudança como uma forma de deslocar o protagonismo do Executivo em uma matéria originalmente sua.
A tramitação também foi marcada por tensões públicas: governo e oposição criticaram pontos centrais do relatório, especialmente a tentativa inicial de equiparar facções criminosas ao terrorismo — tema que, segundo o Planalto, poderia abrir brechas para interferência externa e distorções jurídicas.
Avanços anunciados, lacunas mantidas
O texto aprovado aumenta penas que podem chegar a 40 anos, cria a figura das “organizações criminosas ultraviolentas”, amplia o confisco de bens e endurece a progressão de regime. Mesmo assim, o governo aponta fragilidades: a ausência da expressão “facções criminosas” no texto final — considerada essencial pelo Ministério da Justiça — deve ser objeto de nova tentativa de inclusão em votação futura.
Outro ponto sensível é o dispositivo que redefine o destino dos bens apreendidos. Líderes governistas avaliam que a mudança pode reduzir recursos da Polícia Federal e de fundos federais estratégicos, como o Fundo Antidrogas. O destaque apresentado pelo PT para restaurar a redação original foi rejeitado.
Medidas polêmicas
O projeto prevê:
penas de 20 a 40 anos para crimes de facções ultraviolentas;
regras que determinam cumprimento obrigatório em presídios federais para lideranças;
monitoramento audiovisual de parlatórios, inclusive em contato com advogados — em situações excepcionais;
ampliação do confisco e bloqueio de bens, contas e criptoativos;
mecanismos de intervenção judicial em empresas usadas por organizações criminosas.
Pontos como a possibilidade de vigilância ampliada e a criação de novos enquadramentos penais suscitam críticas de juristas, que alertam para o risco de excessos punitivistas sem garantia de resultados concretos.
Entre o endurecimento e a incerteza
Embora a aprovação seja vendida por parlamentares como uma resposta “mais dura” ao crime organizado, a proposta chega ao plenário com ênfases políticas evidentes, ajustes questionados e lacunas não resolvidas.
O resultado, por ora, é um texto que avança em rigor penal, mas cuja implementação deve enfrentar tensões federativas, disputas por orçamento e contestação jurídica — fatores que ainda colocam em dúvida o impacto real do chamado Projeto Antifacção no combate às facções.
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